Horas Extras em Restaurantes: Como Evitar Passivos Trabalhistas e Proteger o Negócio
Introdução: O Desafio das Horas Extras no Setor de Alimentação
No setor de bares, restaurantes, pizzarias e lanchonetes, lidar com jornadas longas, turnos variáveis e coberturas de última hora devido a faltas faz parte da rotina diária. Em muitos casos, os empregados estendem seus turnos, inclusive por mais de 2 horas – que é o limite máximo conforme Art. 59 da CLT – sem que isso seja devidamente registrado ou pago. O problema é que essas “pequenas exceções” podem se transformar em grandes passivos trabalhistas.
Para empresários do setor de alimentação, surge uma questão fundamental: como está sendo feito o controle e o pagamento de horas extras no estabelecimento? Se a resposta for “de forma informal” ou “será resolvido depois”, talvez seja hora de repensar essa estratégia. O motivo é claro: o assunto “horas extras” foi o tema mais recorrente na Justiça do Trabalho no Brasil em 2024, conforme lista divulgada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).
O Que São Horas Extras e O Que Estabelece a Legislação Trabalhista
Definição Legal de Horas Extras
A Constituição Federal (Art. 7º, XIII) e a Consolidação das Leis do Trabalho (Art. 58, CLT) estabelecem que a jornada padrão de trabalho é de até 8 horas por dia e 44 horas por semana. Qualquer tempo de serviço além disso é considerado hora extra e deve ser remunerado com um adicional de pelo menos 50% sobre o valor da hora normal.
Aplicação em Dias de Folga e Feriados
Essa regra vale inclusive para dias de folga ou feriados trabalhados. Em situações como festas, datas comemorativas, finais de semana ou quando há aumento inesperado de movimento, muitos empresários recorrem a jornadas estendidas para atender à demanda. Aqui está o ponto crítico: se esse tempo adicional não for corretamente registrado, compensado ou pago, abre-se uma brecha para futuras reclamações trabalhistas.
Obrigatoriedade do Controle de Jornada
A legislação (Art. 74, § 2º, CLT) exige que empresas com mais de 20 empregados realizem controle formal de jornada – manual, mecânico ou eletrônico. Na ausência desse registro, para estabelecimentos com 20 ou mais empregados, presume-se como verdadeira a jornada alegada pelo trabalhador, o que pode representar um prejuízo significativo.
Escalas Flexíveis: Legalidade e Formalização Necessária
A Escala 12×36 em Restaurantes
É comum no setor a adoção de escalas alternativas, como a conhecida 12×36 – doze horas de trabalho seguidas por trinta e seis de descanso. Essa modalidade é permitida pela CLT (art. 59-A), desde que haja acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo prevendo tal prática.
Direitos que Devem Ser Respeitados
Mesmo com a jornada 12×36, os direitos ao intervalo para alimentação, descanso semanal remunerado e feriados devem ser respeitados. O descumprimento dessas regras descaracteriza a escala e obriga o empregador a pagar as horas excedentes como extras, com os devidos adicionais.
Convenções Coletivas Específicas
No município do Rio de Janeiro, as convenções coletivas de trabalho pactuadas entre o SindRio e os sindicatos profissionais (Sindirefeições e Sigabam) reforçam essas exigências e trazem outras obrigações acessórias, como o pagamento de benefícios em dias de folga trabalhados e a formalização das jornadas.
Banco de Horas: Cuidados Necessários
Os acordos de banco de horas, apesar de permitidos, precisam seguir prazos claros: até 6 meses se firmados individualmente, ou até 1 ano com acordo coletivo. Além disso, devem estar devidamente documentados, ser claros e transparentes. Práticas informais ou sem controle confiável podem gerar passivos elevados, principalmente se o colaborador for desligado antes da compensação das horas.
Consequências do Pagamento Incorreto de Horas Extras
Ranking de Reclamações Trabalhistas
As reclamações trabalhistas pleiteando o pagamento de horas extras foram o topo do ranking na Justiça do Trabalho no Brasil em 2024, conforme lista divulgada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). Não são raros os casos em que o empregador é condenado a pagar valores acumulados de dois, três ou até cinco anos de jornada extraordinária não registrada.
Custos Diretos e Indiretos
Além dos valores retroativos com acréscimos legais e reflexos nas parcelas trabalhistas de natureza salarial, o empresário pode ser obrigado a pagar:
- Multas por descumprimento da convenção coletiva
- Indenizações por danos morais quando há excesso de jornada habitual
- Custas processuais
- Honorários de sucumbência e perícias
- Em alguns casos, até sofrer bloqueios judiciais nas contas da empresa
- Fiscalizações trabalhistas com possíveis lavraturas de autos de infrações pelos Auditores Fiscais do Trabalho
Impactos Indiretos no Negócio
O impacto indireto é imenso: desgaste com ex-colaboradores, queda no clima organizacional, aumento na rotatividade e até dificuldades em obter crédito bancário ou participar de licitações públicas.
Como Proteger Restaurantes de Passivos Trabalhistas
Medidas Preventivas Essenciais
Existem formas simples e eficazes de manter a conformidade e evitar surpresas desagradáveis:
Investimento em Sistema de Controle de Ponto Aplicativos modernos oferecem registro por celular, reconhecimento facial e relatórios automáticos, facilitando a gestão de horas extras em restaurantes.
Formalização de Escalas e Jornadas Documentar por escrito escalas e jornadas diferenciadas demonstra boa-fé e fortalece a defesa em eventual litígio.
Capacitação de Gestores Treinamentos básicos sobre legislação trabalhista e boas práticas de escala ajudam a evitar erros operacionais que geram passivos.
Consulta à Convenção Coletiva A convenção coletiva da categoria pode prever pisos salariais, adicionais e regras específicas para a região ou setor.
Apoio Jurídico Preventivo Advogados especializados podem revisar contratos, acordos e práticas internas, reduzindo riscos e orientando a tomada de decisão.
Conclusão: Prevenção é Mais Econômica que Remediação
No ambiente dinâmico dos restaurantes e estabelecimentos similares, onde o improviso muitas vezes salva o dia, é compreensível que certas práticas sejam flexibilizadas. Entretanto, quando o assunto é horas extras, não há espaço para informalidade.
O custo de um único processo pode comprometer meses ou anos de trabalho e lucro. Por isso, regularizar a jornada da equipe, adotar controles transparentes e compensar ou pagar corretamente o que é devido não é apenas cumprir a lei: é proteger o futuro do negócio.
A revisão de como as horas extras estão sendo tratadas no estabelecimento deve ser uma prioridade para todos os empresários do setor de alimentação.
Este conteúdo foi produzido por Christiane Araujo, colunista convidada do Mundo Food Service. A autora responde integralmente pela apuração, redação e curadoria das informações aqui apresentadas.
Advogada Trabalhista Empresarial, com ampla experiência no setor de alimentação. Pós-graduada em: Direito Civil e Direito Processual Civil, Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho e Direito Empresarial. Mentora Jurídica. Membra das Comissões de Direito do Trabalho da OAB/Barra da Tijuca e de Mentoria Jurídica da OAB/DC. Membra da Comissão de Direito do Trabalho da ABA/RJ. Colaboradora da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/DC. Sócia fundadora do Escritório Christiane Araujo Advocacia Trabalhista Empresarial.
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Artigo elaborado com base na legislação trabalhista brasileira vigente e nas práticas recomendadas para o setor de alimentação.